Os três tripés do equilíbrio produtivo agrícola

Tenho visto várias postagens sobre a liderança cada vez mais acentuada do Brasil na produção mundial de alimentos, bem como do impacto considerável do agronegócio brasileiro com algo em torno de 30% do PIB Nacional. Tamanha pujança, é a somatória de vários fatores, que culminaram em um crescimento vertiginoso do volume produzido de alimentos, principalmente nos últimos 30 anos, visto claramente pelo descolamento das curvas de área cultivada e produtividade média das culturas, em que a última cresceu muito, apesar da área de cultivo haver aumentado muito pouco (realmente descolaram).

Os três tripés do equilíbrio produtivo agrícola
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     Primeiramente quero agradecer imensamente ao grande amigo Ivens Cristian Vargas, o qual conheço à mais de 40 anos e é um ser humano realmente ímpar, por esta grande oportunidade de compartilhar seu canal comigo. Espero realmente ser digno de tamanha honra.

     Sou filho e neto de agricultores (arrozeiros e pecuaristas) da metade sul do RS, formado em Engenharia Agronômica pela UFSM a 23 anos e pelo que vi neste tempo, me arrisco a ponderar que, apesar de havermos logrado o atual status de “Brasil celeiro mundial”, estamos hoje com grande necessidade de reavaliar e readequar a execução das práticas todo nosso sistema produtivo.

     Antes de iniciar minhas ponderações, quero esclarecer que irei me referir principalmente ao público envolvido diretamente à produção de grãos, que é minha maior vivência, portanto posso discorrer com maior propriedade.

     Então vamos lá.

     Tenho visto várias postagens sobre a liderança cada vez mais acentuada do Brasil na produção mundial de alimentos, bem como do impacto considerável do agronegócio brasileiro com algo em torno de 30% do PIB Nacional. Tamanha pujança, é a somatória de vários fatores, que culminaram em um crescimento vertiginoso do volume produzido de alimentos, principalmente nos últimos 30 anos, visto claramente pelo descolamento das curvas área cultivada e produtividade média das culturas, em que a última cresceu muito, apesar da área de cultivo haver aumentado muito pouco (realmente descolaram).

     É claro que a pesquisa pública, como EMBRAPA, IAPAR, IRGA desde sua criação no início dos anos 1970, também órgãos públicos de extensão rural como a EMATER, as Universidades, Cooperativas e multinacionais, tem uma responsabilidade e mérito enormes neste ganho de volume e atual liderança nacional na produção de alimentos. Entretanto, se pudéssemos indicar uma única técnica, que mais impactou para este crescimento do volume produzido, muito além do aumento de área, certamente poderia ser o desenvolvimento do SPDP (Sistema Plantio Direto na Palha) ou SSDP (Sistema de Semeadura Direta na Palha), o qual, além de promover sustentabilidade e crescimento, ao mesmo tempo promoveu enorme ganho ambiental pela conservação do Carbono e água no perfil do solo, também nos trouxe a redução imediata nos enormes volumes de solo que vínhamos simplesmente mandando para os rios e oceanos, até sua total adoção na década de 1990 em todo Brasil.

     Aqui quero relembrar e homenagear três verdadeiros protagonistas desta batalha do desenvolvimento do hoje cinquentenário SPDP que são Herbert Bartz (Rolândia-PR), Nonô Pereira (Ponta Grossa-PR) e Frank Dijkstra (Ponta Grossa-PR), pois com sua determinação e esforço, somado ao esforço de uma infinidade de outros produtores brasileiros, conseguiram realmente criar algo mais adequado às reais necessidades da agricultura brasileira que, até aquele momento, vinha simplesmente copiando o modelo do hemisfério norte do planeta, majoritariamente regiões de clima temperado, com lenta degradação da matéria orgânica e baixas temperaturas, sendo que aqui no Brasil, as condições são completamente opostas, com clima predominantemente tropical, onde a degradação da matéria orgânica é extremamente rápida.

Os três idealizadores do Sistema de Semeadura Direta na Palha, Herbert Bartz, Nonô Pereira e Frank Dijkstra

     É exatamente com o SSDP (Sistema de Semeadura Direta na Palha), que chego ao título de nosso texto – o EQUILíBRIO.

     Quando do desenvolvimento do SSDP entre 1970 e 1980, se determinaram algumas premissas básicas ou PILARES principais, sem os quais o sistema não teria condições de SUSTENTABILIDADE ou EQUILÍBRIO. Lembremos que a própria sigla SPD ou SSDP, nos mostra que a técnica desenvolvida é um SISTEMA ou conjunto de práticas que, somadas, devem dar um ganho considerável de SEGURANÇA ao sistema produtivo, seja ele em região tropical, intermediário ou mesmo temperado.

     Me preocupa muito quando escuto um colega afirmar categoricamente que a solução para seu produtor atendido é aplicar um insumo isolado e que isso irá resolver a questão...como um remédio para a dor, que não considera as causas, apenas o efeito. Da mesma maneira, frequentemente vejo do outro lado da cerca o empresário ou produtor quando ao ter uma determinada frustração em sua expectativa de produtividade, põe igualmente a culpa em um fator isolado, seja semente, adubo ou defensivo (não estou falando dos eventos climáticos como as estiagens prolongadas que vem massacrando o sul brasileiro).

     Portanto resolvi construir e expor esta linha de raciocínio, lembrando que não é uma questão de quantidade de insumos, mas sim uma questão de conseguir equilibrar os fatores mais importantes. Não só em agricultura, mas em tudo na vida, EQUILÍBRIO e LONGEVIDADE são mais importantes que INTENSIDADE e VELOCIDADE.

     Então eu gosto muito de utilizar a figura de um banquinho de 3 pernas para representar o SPD ou SSDP, pois sem uma ou duas pernas fica totalmente impossível ele permanecer na posição vertical, muito menos de sustentar alguém sobre ele. Pois bem, o SSDP também tem seus três PILARES ou sustentáculos básicos onde, sem a adoção dos três, a manutenção do sucesso do produtor fica bem mais difícil e menos segura.

     Relembrando essas premissas, fartamente citadas pela literatura nacional, no SSDP chegamos ao

PRIMEIRO TRIPÉ DO EQUILÍBRIO PRODUTIVO – pilares do SSDP (ou SPD)

1°- Não revolvimento de solo;

2°- Volume de palhada na superfície do solo (cobertura morta);

3°- Rotação de culturas (diferente de sucessão de culturas).

     Este primeiro tripé, tão falado e ao mesmo tempo (por várias razões que também conhecemos e não nos cabe discutir aqui os porquês), tão negligenciado e porque não dizer tão esquecido, não só por parte dos produtores (que em minha opinião são as grandes vítimas deste sistema comercial), mas também por grande parte dos colegas profissionais de agronomia, que por sua vez estão lutando para cumprir suas metas, das mais variadas e geralmente tarefas hercúleas.

     Concluindo a questão do primeiro tripé do equilíbrio produtivo, o que vemos hoje, na grande maioria dos casos, é a execução apenas do não revolvimento de solo, o qual, sem a manutenção de uma boa cobertura de palhada na superfície, complementado por uma correta programação anual de rotação de culturas nos talhões da fazenda, em que se tentasse não repetir por mais de dois anos a mesma cultura na mesma época, começam a aparecer consequências cada vez mais frequentes e também mais intensas, como é o caso dos nematoides de raiz e da compactação do solo a baixas profundidades.

     Falando em solo, agora vamos ao SEGUNDO TRIPÉ DO EQUILÍBRIO PRODUTIVO. Sou da escola tradicional de agronomia onde, quando falávamos em nutrição de plantas, falávamos em gerir uma gama de macro e micronutrientes fundamentais para a planta se manter, crescer e reproduzir, ou seja, prover N, P, K, Ca, Mg, S, B, ...etc..., basicamente de fontes inorgânicas (fertilizantes químicos, pela sua maior concentração e liberação rápida dos nutrientes), sempre calculando uma quantidade a aplicar, de acordo com a demanda da cultura, fertilidade natural do solo e também com as características e concentrações do fertilizante....e tudo certo....projeto, cálculo e execução....química e matemática pura.

     Então, de um certo tempo para cá, começamos a perceber, que esta maneira de proceder, considerando apenas a questão química, realmente os resultados não eram lineares, ou seja, calcário e adubo não são garantia de bons e estáveis resultados, mesmo com o clima sendo favorável. Vimos então que, além da química, tão importante também são a Física e a Biologia deste solo que, além de sustentar, fornece nutrientes, água e oxigênio às raízes das plantas (solo compactado perde os poros, portanto não tem mais oxigênio – raízes respiram).

SEGUNDO TRIPÉ DO EQUILÍBRIO PRODUTIVO – fatores do solo

1°- QUÍMICA -quantidade de nutrientes disponíveis às plantas, pH, CTC, etc...;

2°- BIOLOGIA - vida realmente existente – fungos, bactérias, micro e mesofauna;

3°- FÍSICA -existência ou não de compactação, estruturação, porosidade, capacidade de retenção de água em profundidade.

     Chegando ao desfecho de nossas considerações, vamos observar que, mesmo respeitando e executando com perfeição as variáveis do 1º e 2° tripés citados acima, ainda não teríamos as condições que nos garantissem a tão sonhada estabilidade no histórico das produtividades, pois lembremos que a água é responsável simplesmente por 60% da produtividade das culturas, nos dando a deixa para chegar ao

 TERCEIRO TRIPÉ DO EQUILÍBRIO PRODUTIVO – fatores da produtividade:

1° - ÁGUA DISPONÍVEL E TEMPERATURA ADEQUADA........60% da produtividade;

2° - SOLO EQUILIBRADO (química, física e biologia)...........20% da produtividade;

3° - MANEJO ADEQUADO DA CULTURA...............................20% da produtividade.

     Analisando com atenção ao que foi apresentado acima, podemos concluir que produzir alimentos em grande escala, realmente não é uma tarefa para amadores, que ainda temos muito a melhorar e aprender, que apesar do grande avanço das tecnologias digitais e eletrônicas, entender as reais necessidades das plantas, aliando a um manejo mais inteligente e principalmente EQUILIBRADO dos fatores de produção, ainda é o caminho mais adequado e barato para lograr uma boa sequência de boas produtividades e principalmente que as máquinas poderão executar os trabalhos com maior precisão e rapidez, mas ainda existe um grande caminho em agricultura e agropecuária até que elas consigam considerar esta quantidade enorme de variáveis que impactam na tomada de decisão do agricultor brasileiro e mundial.

Ronaldo Antunes – Antunes Assessoria Agropecuária

Junho 2023